A mãe desnecessária - e a necessidade de aprender sobre o desapego
Hoje decidi trazer um texto muito interessante para conseguirmos refletir sobre a relação de superproteção dos pais com as crianças. Afinal, é normal que o instinto dos pais busquem proteger seus pequeninos. Mas até que ponto isso é realmente saudável? Será que não é necessário aprender sobre o desapego para conseguimos que a criança consiga desenvolver a tão desejada e necessária resiliência em enfrentar situações desafiadoras? Após o texto abaixo, escrevo uma reflexão mais detalhada sobre esse assunto.
A mãe desnecessária - por Márcia Neder
A boa mãe é aquela que vai se tornando desnecessária com o passar do tempo. Várias vezes ouvi de um amigo psicanalista essa frase, e ela sempre me soou estranha.
Até agora. Agora, quando minha filha de quase 18 anos começa a dar voos-solo.
Chegou a hora de reprimir de vez o impulso natural materno de querer colocar a cria embaixo da asa, protegida de todos os erros, tristezas e perigos. Uma batalha hercúlea, confesso. Quando começo a esmorecer na luta para controlar a super-mãe que todas temos dentro de nós, lembro logo da frase, hoje absolutamente clara.
Se eu fiz o meu trabalho direito, tenho que me tornar desnecessária.
Antes que alguma mãe apressada me acuse de desamor, explico o que significa isso.
Ser “desnecessária” é nã o deixar que o amor incondicional de mãe, que sempre existirá, provoque vício e dependência nos filhos, como uma droga, aponto de eles não conseguirem ser autônomos, confiantes e independentes. Prontos para traçar seu rumo, fazer suas escolhas, superar suas frustrações e cometer os próprios erros também. A cada fase da vida, vamos cortando e refazendo o cordão umbilical. A cada nova fase, uma nova perda é um novo ganho, para os dois lados, mãe e filho.
Porque o amor é um processo de libertação permanente e esse vínculo não pára de se transformar ao longo da vida. Até o dia em que os filhos se tornam adultos, constituem a própria família e recomeçam o ciclo. O que eles precisam é ter certeza de que estamos lá, firmes, na concordância ou na divergência, no sucesso ou no fracasso, com o peito aberto para o aconchego, o abraço apertado, o conforto nas horas difíceis.
Pai e mãe – solidários – criam filhos para serem livres. Esse é o maior desafio e a principal missão.
Ao aprendermos a ser “desnecessários”, nos transformamos em porto seguro para quando eles decidirem atracar.
A ideia do desapego pode ser um dos conceitos mais difíceis de se aplicar na maternidade. O instinto é de sempre proteger a criança de tudo e qualquer sofrimento. Eu, você e todos os adultos já aprendemos a dominar de alguma forma os sentimentos difíceis, desenvolvemos resiliência e aprendemos a nos adaptar (mesmo que nem sempre de forma saudável) a situações desafiadoras. Então é, no mínimo, agonizante de se ver e observar uma criança pequena tentando encaixar uma peça no buraco errado, sem intervir e apontar para o lugar certo.
Mas não pensamos que ao fazer isso, também roubamos da criança a oportunidade de aprender e de sentir também aquela satisfação de que ela mesmo conseguiu resolver esse problema. Não é só o brinquedo de encaixe que a criança precisa que os adultos se restrinjam de resolver as pressas o problema.
Permitir que a criança enfrente sentimentos de desapontamento, tristeza e/ou tédio, é fundamental para que elas possam desenvolver a tal resiliência emocional tanto desejada. Permitir que a criança mergulhe nesses sentimentos não significa que iremos abandonar ela para lidar sozinha. Precisamos sentar junto da criança e guiá-la para superar isso. E como seria isso na prática?
A criança quebrou (sem querer) a tela do tablet/celular. Na hora de pagar pelos consertos com a própria mesada, ela irá se sentir desconfortável em usar o dinheiro que juntou nos últimos meses com muito cuidado para comprar outro objeto. Se permitimos que o sentimento de resgatar a criança domine a situação, a solução é fácil: você puxa sua carteira, paga pelo conserto e alivia de forma instantânea o turbilhão de sentimentos dessa criança. Mas vamos pensar o que ela aprendeu com essa situação? Quais habilidades ela desenvolveu?
Provavelmente aprendeu que ser amada significa ter alguém prestes a resgatar e resolver todos os problemas dela pra sempre. Por isso, a alternativa é permitir que a criança sinta tudo que é envolvido no problema e apenas acompanhar. Você pode falar: “Notei que você se sentiu dividido em usar seu dinheiro para pagar pelo conserto. É muito frustrante/difícil usar o dinheiro que você guardou com tanto cuidado para um reparo que nem esperava. Você pode escolher o que é mais importante para você neste momento: consertar o seu tablet ou comprar aquilo que você estava planejando com o dinheiro que estava guardando.”
Percebe como nessa situação não estamos oferecendo uma solução imediata para a criança que eliminaria todos os sentimentos negativos? Estamos, na verdade, junto da criança, para ajudar e apoiar ela em habilidades que tantos desejamos que desenvolva. E é fácil de perceber tudo que a criança pode aprender.
Tem alguma dúvida ou sugestão de tema que gostaria de ver respondida aqui no blog? Manda pra mim na caixinha de perguntas do instagram @sanda.consultoria. Te espero lá. 😊